Ciclo Evolutivo do ESG: Entre luxo e necessidade

Ciclo Evolutivo do ESG: Entre luxo e necessidade

Os conceitos de ciclos econômicos não são tão recentes, datados do meio do século 19, e uma dessas correntes teóricas vê os processos como sendo ondulatórios, ocorrendo em meio a uma evolução natural. O ESG (boas práticas ambientais, sociais e de governança) também passou por flutuações desde sua popularização em 2004, a partir da publicação do relatório Who Cares Win, iniciativa da ONU e instituições financeiras.

No início dos anos de 2020, diante dos impactos da pandemia, deu um salto e se expandiu, em decorrência da percepção de como os compromissos e práticas das empresas frente ao meio ambiente, gestão, trabalhadores e demais stakeholders eram tão importantes quanto seus resultados financeiros.

Mas, de imperativo estratégico, o ESG vem enfrentando questionamentos e ceticismos e isso fica claro em pesquisas, como da Edelman, realizadas na Holanda, pela qual quase 3 de cada 4 investidores institucionais acreditam que as empresas não cumprem seus compromissos ESG diante de três fatores (ambiental, social e governamental), que estão interligados.

O ESG em Ciclos de Crescimento e Estabilidade

A partir deste ano, pelo menos em tese, o ESG estaria entrando em um novo ciclo, saindo do "pico" para o "vale" ou seja, do crescimento para a estabilidade, com o aumento de adesões, seja de companhias ou investidores. Vários fatores estariam contribuindo para fomentar essa nova fase.

Um deles seria a falta de unificação de métricas ESG globais, o que impede uma classificação confiável sobre o verdadeiro impacto das empresas diante do meio ambiente, da sociedade e da gestão. Embora não haja consenso, grande parte dos países, inclusive o Brasil, vêm ampliando a regulação do ESG, que cresceu mundialmente 155% na última década.

Outros analistas marcam sua visão negativa sobre a evolução do ESG. Para Tara Shirvani, por exemplo, que liderou projetos de ESG de infraestrutura do Banco Mundial, o ESG reúne elementos muito diferentes. Assim, se for possível para uma empresa de transição energética utilizar em sua cadeia de produção um parceiro que empregue energia limpa para extrair lítio, ele se tornará inviável ao não cumprir os requisitos de direitos humanos de seus trabalhadores. Essa questão acabou gerando uma dúvida se o ESG é um conceito a ser tratado monoliticamente ou precisaria ser desmembrado.

A Politização do ESG

A polêmica em torno do conceito do ESG ganhou robustez, quando o todo poderoso Larry Fink, CEO da BlackRock, maior gestor de fundos do mundo, comunicou no ano passado que não usaria mais o termo ESG porque se tornou politizado, principalmente nos Estados Unidos, entre direita e esquerda, incentivado pelos chamados grupos "anti-woke", que demonstram intolerância sobre questões de raça, LGBT e outras demandas sociais.

O termo "woke" era empregado pelos negros americanos com o significado de estar desesperado para as injustiças raciais e demais desigualdades nos EUA, mas foi saudável por políticos brancos e conservadores para significar o "fim de tudo que é bom na América".

O ESG como Bem de Luxo ou Necessidade Básica?

Independente dessa perspectiva política, uma nova polêmica gerou vários artigos avaliando se o ESG é um bem de luxo ou uma necessidade básica para as corporações, como o texto da Stanford Business School: "Is ESG a Luxury Good?".

Os autores comentam que "em economia, um bem de luxo é um item cuja demanda aumenta com o preço. Para a maioria dos bens, um preço elevado reduz a procura, tornando-os menos acessíveis, mas no caso de um bem de luxo, um preço elevado estimula a procura, em parte devido aos benefícios sociais que o comprador recebe ao sinalizar aos outros a sua capacidade de pagar. Quando os consumidores estão satisfeitos, é mais provável que comprem um bem de luxo; quando sua riqueza diminui, você procura esses tipos específicos de bens também diminui. Pode-se argumentar que o ESG é um bem de luxo".

Essa afirmação, contida no texto, leva em conta que o ESG surgiu em uma economia global mais próspera, com inflação baixa e mercado forte. Alegam também que no contexto atual de inflação mais alta (nos Estados Unidos), juros elevados e um cenário econômico externo turbulento, o interesse dos investidores por questões ambientais e sociais se retrocede.

O texto é apoiado em uma pesquisa com investidores jovens e institucionais, que recuperaram de seus compromissos ESG diante de um quadro econômico menos estável e observaram que se o investimento nas práticas ESG seguirem um padrão econômico do luxo, os conselhos de administração das companhias repensarão como "planejar, priorizar e investir em ESG".

A Necessidade de Gestão Proativa do ESG

O cenário atual demonstra que os compromissos com ESG não podem ser limitados à adesão a modismos ou respostas reativas. À medida que a economia e as demandas sociais oscilam, o acompanhamento contínuo e a consultoria especializada se tornam essenciais para evitar decisões fragmentadas ou desalinhadas com a estratégia empresarial de longo prazo.

A presença de profissionais capacitados ajuda a empresa a identificar não apenas riscos emergentes, mas também oportunidades de inovação e sustentabilidade que podem passar despercebidas. Assim, essa orientação contínua garante que a organização esteja sempre preparada para navegar em ciclos de crescimento ou crise, mantendo seu propósito e orientação.

Empresas que buscam consistência em suas práticas ESG não podem prescindir de uma gestão proativa e consultiva. A consultoria especializada permite não apenas a implementação de análises robustas, mas também a criação de políticas que acompanham a evolução do mercado e da legislação. Diante das críticas crescentes e da pressão por resultados concretos, um acompanhamento estratégico permanente é fundamental para validar o impacto das iniciativas e garantir que os esforços realizados reverberem junto aos stakeholders e se traduzam em valor econômico e social duradouro.

O Cenário Econômico Atual e o Futuro do ESG

A análise dos autores sobre se o ESG é luxo ou necessidade, leva em conta o quadro da economia norte-americana em maio deste ano, que tem melhorado seus índices. Segundo análise da Vanguard, atualmente os EUA apresentam um mercado de trabalho normalizado, com taxa de desemprego em 4,1% em setembro; sendo que o Federal Reserve parece ter vencido a luta contra a inflação e o crescimento econômico previsto para este ano está acima de 2%. O Brasil, igualmente, tem projeção de expansão da economia, com o Banco Central projetando crescimento do PIB em 3,01% e inflação abaixo de 4%.

Desta forma, as empresas estão com um quadro favorável para exigir um ciclo de crescimento do ESG, continuando a investir, concordamos com a lógica dos professores de Stanford, de que o movimento cíclico pró-ESG aumenta quando a economia é mais aquecida.

Contudo, outros analistas apresentam dados divergentes de que o ESG está entrando no "vale". Pesquisa da Bloomberg afirma que o cenário de investimentos sustentáveis ​​continua sendo prioritário para gestores de fundos e a estimativa é que os ativos ESG atingirão US$ 40 trilhões até 2025, demonstrando que o quadro de investimentos sustentáveis ​​continua aquecido, caminhando para o "pico ".

Nessa perspectiva, outra reafirma que o ESG veio para ficar enquanto ferramenta valiosa para gerenciar riscos, a despeito da politização anti-ESG ocorrida nos Estados Unidos. Outros, avaliam ainda – como o Morgan Stanley Institute for Sustainable Investing, através de pesquisa – que 77% dos investidores individuais continuam com interesse crescente em sustentabilidade. Continuando a acreditar no ESG, busca empresas e fundos que causem impactos positivos no meio ambiente e socialmente, sendo a crise climática é o tema mais relevante para este público.

A Crise Climática e a Materialidade do ESG

A crise climática vem reforçando a importância do fator "E", que já liderou o interesse entre os três fatores ESG e a importância dos diversos grupos de partes interessadas, que interessa conhecer mais sobre políticas e práticas das organizações e pressionar por melhores resultados, além do nível de responsabilidade e transparência em relação a práticas sustentáveis.

Isso ficou claro quando a capital paulista foi atingida por uma severa tempestade em outubro, que deixou mais de 700 mil imóveis sem energia elétrica por dias. Na peneira das opiniões, ficou claro que as causas e impactos das mudanças climáticas precisam constar da estratégia de sustentabilidade das empresas que prestam serviços essenciais – como energia elétrica – na visão dos cidadãos, governos, reguladores, mídia etc.

Qual o propósito dos fornecedores de energia? Seus compromissos estão alinhados às necessidades dos stakeholders e direcionados a entregar resultados esperados? Levam em consideração as expectativas dos clientes e funcionários sobre o desempenho dos serviços prestados? Como abordar o ESG em sua jornada? Quais mudanças irão produzir em seus processos operacionais e qual o resultado desejado?

Nesse cenário conturbado, a materialidade ESG parece ser menos um luxo, uma ostentação e mais uma necessidade básica se olharmos para o futuro, no qual as expectativas de todos os stakeholders frente à crise do clima aumentam e engajam as pessoas. Vale lembrar que é por meio da escuta dos stakeholders, seja conhecendo suas preocupações, necessidades e contribuições, que se torna possível identificar insights importantes, preencher lacunas e a perspectiva coletiva a ser priorizada no espectro ESG.

A crise climática parece um assunto novo, porque em nenhum ano anterior você afetou tão diretamente pessoas e empresas como nos eventos de 2024; mas desde 1990, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), criado em 1988 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), vem divulgando relatórios científicos sobre a crise do clima para orientar a formulação de políticas climáticas internacionais e inventários sobre Gases de Efeito Estufa (GEE).

Conclusão

Além da economia, os ciclos do ESG são afetados pelas características cíclicas? Isso será de expansão, contração e recuperação? Certamente, o ESG é uma ferramenta complexa e em evolução e deve permear ainda mais as estratégias de negócios das corporações nos próximos anos, mas sofre com os humores do clima, da economia e da política. E, assim, como na economia, só é conhecido por estimativa de tendências e, neste ponto, tem demonstrado forte resiliência.

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