Dados alarmantes revelados pelo Observatório Brasileiro das Desigualdades mostram que a insegurança alimentar afeta de forma desproporcional as mulheres negras no Brasil. Segundo o relatório, pelo menos 12,5% desse grupo populacional enfrenta situação de insegurança alimentar moderada e grave, enquanto entre os homens não negros esse índice é de apenas 5,5%.
Esses números evidenciam as profundas desigualdades que permeiam a sociedade brasileira, onde a combinação de raça e gênero coloca as mulheres negras em uma posição de extrema vulnerabilidade. Além da insegurança alimentar, o estudo também aponta outros indicadores alarmantes, como o rendimento médio mensal da mulher negra, que é apenas 42% do rendimento do homem não negro.
A Realidade da Insegurança Alimentar
O relatório do Observatório Brasileiro das Desigualdades define a insegurança alimentar moderada como aquela em que os cidadãos têm dificuldade para conseguir alimentos, enquanto a grave refere-se à fome propriamente dita. Esse cenário é ainda mais preocupante quando se trata das mulheres negras, que representam 12,5% desse grupo.
"O que chama a atenção é a nitidez com que a gente percebe os grupos mais desfavorecidos e vulneráveis [mulheres e pessoas negras]", afirma Oded Grajew, membro do Pacto Nacional pelo Combate às Desigualdades. Ele destaca que, entre os homens negros, a taxa de insegurança alimentar moderada e grave é de 12,3%, enquanto entre os não negros esse índice cai para 5,8% entre as mulheres e 5,5% entre os homens.
Desigualdades Interseccionais
Além da insegurança alimentar, o relatório também revela outras disparidades alarmantes entre os grupos populacionais. O rendimento médio mensal da mulher negra, por exemplo, é de apenas 42% quando comparado ao do homem não negro. Além disso, elas estão mais desempregadas (11,5%) do que os homens não negros (5,2%).
Oded Grajew enfatiza que a combinação de raça e gênero é a que merece a maior atenção, pois é nesse cruzamento que se encontram os grupos mais vulneráveis e marginalizados da sociedade brasileira. "Combater a desigualdade é mudar as prioridades e investir onde é mais necessário. É importante dar atenção prioritária para aqueles grupos mais vulneráveis e marginalizados. No caso do Brasil, é a população negra e são as mulheres", afirmou.
Sinais de Progresso, Mas Muito a Ser Feito
Apesar dos dados preocupantes, o relatório também traz alguns sinais positivos. Houve uma queda de 40% na proporção de pessoas em extrema pobreza, sendo a maior redução entre as mulheres negras. Também houve uma queda de 20% no desemprego e um ganho real no rendimento médio de todas as fontes, na ordem de 8,3%.
Outro dado animador é que a proporção de mulheres negras de 18 a 24 anos que cursa o ensino superior chegou a 19,2%, um crescimento de 12,3% em relação ao ano anterior. Esses avanços, no entanto, ainda não são suficientes para reverter as profundas desigualdades que marcam a realidade brasileira.
O Caminho para a Igualdade
Oded Grajew acredita que o caminho para a redução das desigualdades passa por um aperfeiçoamento das políticas públicas e do sistema fiscal e tributário. "Todos os países que pregam pela sociedade mais igualitária têm um sistema fiscal tributário que deve ser instrumento da redução da desigualdade", afirma.
Além disso, é fundamental que a sociedade como um todo tenha a percepção da gravidade da situação e se mobilize para cobrar ações efetivas do poder público. Um levantamento recente do Instituto Cidades Sustentáveis e do IPEC mostrou que, embora a maioria das pessoas acredite que suas condições de vida melhoraram em relação às de seus pais, essa percepção é menor entre as classes mais baixas.
"Essa desigualdade ainda é um nó. Não basta a gente melhorar a sociedade como um todo, mas é importante que quem está numa situação pior consiga melhorar mais", alerta Igor Pantoja, coordenador de Relações Institucionais do Instituto Cidades Sustentáveis.
O combate à desigualdade alimentar e às demais disparidades que afetam as mulheres negras no Brasil é um desafio urgente e complexo, que exige ações coordenadas em diversas frentes. Somente com políticas públicas efetivas, um sistema tributário justo e a mobilização da sociedade será possível construir um país mais equitativo e inclusivo para todos.